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Diversidade e inclusão

5 min de leitura

A diversidade é inimiga do bom humor?

Piadas contam mais que uma história engraçada: elas revelam comportamentos, posicionamentos e, às vezes, preconceitos e intolerância; mas como gerenciar a liberdade de fazer humor nos ambientes corporativos?

Colunista Daniele Botaro

Daniele Botaro

15 de Julho

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Artigo A diversidade é inimiga do bom humor?

“Mas foi só uma piada!”

“Você é muito sensível!”

"Estou brincando! Você leva tudo muito a sério! ”

Soa familiar? É isso que muitas pessoas escutam quando se posicionam negativamente ao humor impróprio no local de trabalho. Seja um comentário improvisado, uma observação casual ou uma expressão para fazer graça sobre uma característica de alguém, admitir esses comportamentos pode ser prejudicial. Além disso, comportamentos como esse podem ter um impacto duradouro na cultura da sua empresa.

Então é preciso ter uma “polícia da diversidade”? Não. Respeitar as pessoas não significa dizer que não podemos nos divertir no ambiente de trabalho. Eu, por exemplo, sou líder de diversidade e inclusão em uma empresa e sou também a meme maker do meu time. Há maneiras de criar espaços saudáveis de diversão dentro do seu ambiente de trabalho, respeitando grupos e histórias diversas.

E se algo não ocorrer bem e alguém se sentir ofendido, seu papel como líder é o de criar um ambiente em que é permitido a pessoa levantar a mão para dizer que não se sentiu bem e que gostaria que os comentários parassem.

Regras de ouro: não faça piadas para criar intimidade. Crie a intimidade primeiro, para depois fazer a piada. Conheça seu time de forma individualizada. A inclusão não é sobre tratar a todos/todas/todes iguais – e nem da maneira que você gostaria que te tratassem. A inclusão está em tratar a todos como eles gostariam de ser tratados.

Até onde podemos brincar?

De acordo com um grande experimento realizado em 2002 pelo psicólogo Richard Wiseman, com quase 2 milhões de pessoas em 70 países, a piada mais engraçada do mundo é a seguinte: dois caçadores estão na floresta quando um deles desmaia. Ele parece não estar respirando e seus olhos estão parados. O amigo liga para a emergência e diz: “Acho que meu amigo está morto! O que posso fazer?" A pessoa do outro lado da linha diz: “Calma, eu vou te ajudar. Primeiro é preciso ter certeza de que ele está morto”. Há um silêncio na ligação e depois um tiro é ouvido. De volta ao telefone, o cara diz: “Ok, e agora?”

Você riu dessa piada? Eu não, mas muita gente sim. O que acontece é que as pessoas têm diferentes maneiras de interpretar mensagens. Os colaboradores da sua empresa vêm de contextos familiares, culturas e costumes diferentes, o que traz uma complexidade muito grande para o que cada pessoa considera engraçado e o que considera humor ou ofensa.

Quando você tem um grupo numericamente majoritário, como é o caso de homens, brancos, heterossexuais e sem deficiência, é comum que muitos deles possuam o mesmo estilo de humor e que achem graça nos mesmos tipos de piada. É comum esperar que esses homens também tenham maior nível de tolerância às gracinhas feitas por colegas, para não parecerem fracos ou não terem sua sexualidade julgada.

Dessa maneira, dizer que você pode fazer piada com aquela mulher que aceita a piada, não significa que isso não vai ofender outras mulheres. Cada pessoa tem um nível de tolerância e depende de cada um de nós saber qual é esse limite. Na dúvida, não faça a piada e procure alternativas para fazer as pessoas rirem.

Às vezes, pode ser apenas uma má escolha de palavras sem nenhuma intenção por trás disso. Mas muitas vezes, provocações e piadas inadequadas escondem uma tentativa mesquinha de colocar um colega de trabalho ou membro da equipe para baixo.

Quando um homem “brinca” com a diretora de vendas dizendo que o jantar de negócios havia rendido um bom resultado, afinal ela tinha conseguido fechar aquela venda milionária, isso impacta diretamente na maneira como as pessoa veem a capacidade de vendas dessa diretora. As pessoas começam a acreditar que as mulheres vendem mais porque se arrumam e isso conquista os clientes e se esquecem de todo o esforço e trabalho duro que ela teve para conseguir fechar a proposta e trazer um bom resultado para a empresa.

O fato da piada ser comum, não significa que ela é bem-vinda ou aceitável. Lembre-se que acompanhado de brincadeiras que parecem inofensivas, surgem comportamentos e expressões carregadas de preconceitos que resultam em atitutes discriminatórias. E essas sim, são passíveis de ações de punição tanto dentro das políticas da empresa, como em processos civis e criminais.

Tolerância zero funciona?

Não. Sempre haverá ocasiões em que alguém fará uma declaração infeliz ou tentará tornar algo que gere uma microagressão à alguém ou algum grupo. O que você precisa observar é se há um padrão de piadas e humor inadequado no seu grupo, que seja mais maldosos do que engraçado. Ofereça treinamentos e espaços de conversas corajosas, além de maneiras para que colaboradores relatem incidentes anonimamente. Assédio não é uma piada, então certifique-se de ser capaz de lidar com as situações quando elas surgirem.

A importância do humor no trabalho

Estudos têm mostrado que o humor no local de trabalho nos incentiva a colaborar, nos dá motivação e pode ajudar a prevenir o esgotamento (burnout). Além disso, em locais de trabalho onde o humor é compartilhado abertamente, a cultura tende a encorajar as pessoas a serem elas mesmas, e o resultado é uma força de trabalho mais leal e produtiva.

Só que além de melhorar o ambiente, o humor também pode trazer benefícios para a sua carreira. Uma pesquisa da consultoria de recolocação Robert Half mostrou que 91% dos executivos entrevistados achavam que o senso de humor era importante para o avanço na carreira e, 84% concordaram que alguém com bom senso de humor faz um trabalho melhor. Segundo os entrevistados, o humor faz alguém parecer calmo e no controle de uma situação, e capaz de olhar para ela com uma perspectiva mais ampla.

Muitos profissionais acreditam que o humor simplesmente não tem lugar em um ambiente sério ou que poderiam colocar em risco sua credibilidade se fizessem piadas ou usassem humor em seu dia a dia. No entanto, cada vez mais pesquisas têm demonstrado que o humor é uma ferramenta poderosa para construir confiança entre as pessoas. Só não se esqueça de que o humor deve ser respeitoso e a piada só é engraçada quando todos, todas e todes podem rir dela.

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Colunista Daniele Botaro

Daniele Botaro

Head de diversidade e inclusão da Oracle para a América Latina, ela também é embaixadora da Gaia+. Foi empreendedora, e sócia-diretora, da Impulso Beta, consultoria especializada em programas de diversidade.

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