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As tendências comportamentais que prometem moldar os negócios em 2022

Relatório Fjord Trends 2022 aponta para o início de uma transformação comportamental. Ivan Lucchini, diretor executivo da Fjord, parte da Accenture Interactive, explica como acompanhar essas mudanças

Rodrigo Oliveira

22 de Fevereiro

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Artigo As tendências comportamentais que prometem moldar os negócios em 2022

Dois anos após o início da pandemia, sobreviveu quem enxergou as coisas como elas são: interconectadas. Existe um tecido que costura os relacionamentos entre clientes, funcionários e sociedade. Basta puxar um fio para comprometer o todo. Eis a metáfora escolhida pela Accenture Interactive para elaborar o relatório Fjord Trends, que em 2022 chega à 15ª edição.

A pesquisa desenvolvida pela área de design de experiência da Accenture se concentra em como as pessoas, organizações e marcas estão atendendo às necessidades humanas. Para desenrolar o assunto, foram consultados mais de 2 mil profissionais espalhados pelo mundo. O estudo reúne essas respostas em cinco pontos que terão implicações significativas para 2022: o aumento do individualismo, o questionamento da mentalidade de abundância, a ascensão do metaverso, a crise de confiança e a atenção ao cuidado. O diretor executivo da unidade de design da Accenture, Ivan Lucchini, comenta cada um dos temas na entrevista a seguir.

MIT Sloan Review Brasil: Como a Accenture chegou à conclusão deste novo relatório?

Ivan Lucchini: A cada ano, a Accenture publica uma trilogia de estudos sobre tendências, oferecendo uma visão abrangente sobre o futuro das pessoas, tecnologias e dos negócios. O Fjord Trends foca no comportamento humano. É natural que a fronteira entre uma tendência e outra se misturem. Isso porque a conduta humana combina aspectos racionais e emocionais. Apesar disso, sempre procuramos um tema central para amarrar o relatório. Aquele "fio" capaz de costurar as cinco tendências. Para 2022, concluímos que o "fio" é o próprio tema. A interconexão de assuntos, pessoas e regiões nunca esteve tão presente. Uma coisa que acontece lá do outro lado do mundo reflete no Brasil. Assim como um tecido. Se você puxa de uma ponta, e puxa da outra, esse tecido enruga. A escolha pela temática do tecido da vida é uma resposta ao avanço da interdependência.

MIT: O aumento do individualismo e da independência foi a primeira tendência identificada pelo estudo. Como esse quadro se aplica ao consumo?

Lucchini: Percebemos um aumento da tensão entre o individualismo e o coletivo, entre a autodefinição e o pertencimento. As pessoas estão se questionando mais sobre quem são e o que importa para elas e, em alguns casos, estão mais confiantes para misturarem o lado pessoal e profissional. Para as empresas, significa trabalhar em ofertas ainda mais individualizadas e fluidas. Também significa uma disputa maior por talentos, por vezes com empresas de diferentes setores, de diferentes tamanhos ou mesmo com atividades informais que se conectem mais com os valores e rotinas individuais. É importante fazer um recorte de classe para essa tendência, já que a imensa desigualdade no país faz com que a população pobre, que é numerosa, se fortaleça através de redes de apoio, com pouco ou nenhum espaço para escolhas individuais.

MIT: A crise na cadeia de suprimentos resultou em tempos de maior escassez. Como encontrar um equilíbrio entre a individualização da vida cotidiana e a necessidade de colaboração?

Lucchini: O pensamento de abundância nunca foi realidade para a maioria da população no Brasil. Por outro lado, boa parte da camada que influencia a estratégia das empresas possui essa mentalidade. Pela primeira vez, em algum tempo, essa camada se sentiu mais ameaçada. Quando encontrou dificuldade de acesso médico imediato. Quando não conseguiu encontrar um motorista no aplicativo. A conveniência sempre foi um mantra das marcas. Mas essa lógica cobra um preço. Para obter um produto de forma rápida e barata, alguém do outro lado acaba sendo espremido. Essa reflexão reforça o conceito de tecido. Em escala global, o que adianta ter mais de 70% da população brasileira vacinada, enquanto a Nigéria não atingiu nem 3%? O importante é entender que uma camada que sempre falou em conveniência, e contou com ajuda de fôlego financeiro para não comprometer a rotina, sentiu a interconexão da escassez.

MIT: O metaverso ainda é pouco compreendido pela maioria das pessoas. Ainda assim, companhias como Nike, Ralph Lauren e Stella Artois já começaram a replicar a realidade através de dispositivos digitais. Esse tipo de tecnologia se restringe ao mercado internacional?

Lucchini: Mesmo globalmente, essa tendência traz mais perguntas do que respostas. O metaverso ainda está mais no campo da experimentação para as empresas. O ponto é que quem testar antes também vai aprender antes. A Pfizer realizou a primeira experiência de vacinação virtual por meio de um conhecido servidor de role play do GTA Online. Mas a ideia de replicar o ambiente real no virtual não é exatamente nova. Empresas do ramo de óleo, gás e mineração já utilizam realidade aumentada para avaliar situações de risco. Por aqui, também temos Banco do Brasil, O Boticário e Renner ensaiando algumas coisas. Pode ser que aproveitemos essas potencialidades de forma mais ampla com o passar do tempo.

MIT: O número de canais para aprender sobre o mundo e solucionar dúvidas está crescendo. Ao mesmo tempo, o volume de desinformação nos faz duvidar dessas respostas. O que as marcas brasileiras precisam fazer para ganharem confiança e serem ouvidas?

Lucchini: Estamos diante de uma crise a respeito da qualidade das informações. Sejam elas vindas de marcas, do governo, da igreja ou do noticiário. Existem dois caminhos para refletir sobre esse tema. O primeiro tem a ver com a veracidade dos fatos. A Agência Lupa lançou um programa de treinamento para combater a desinformação em contextos eleitorais. Também temos o Pegabot, uma ferramenta que calcula a probabilidade de uma conta nas redes sociais ser automatizada. O segundo caminho diz respeito à possibilidade de adicionar camadas de informação que criem diferenciação. A fintech sueca Doconomy, por exemplo, lançou um cartão de crédito que estabelece o limite de gastos com base no impacto do consumidor no meio ambiente. Aqui a informação foi utilizada como diferencial competitivo. Não é algo que se espera de uma instituição financeira. Fornecer informações técnicas sobre determinado serviço é básico. O diferencial é aprimorar a experiência do cliente com criatividade e relevância.

MIT: A pandemia causou estragos à saúde mental em todo o mundo. Diante disso, as empresas precisam abrir espaço para poder praticar o cuidado. Como essa responsabilidade pode ser incorporada pelas organizações?

Lucchini: Lembra que em janeiro o (surfista) Gabriel Medina abriu mão de participar da Liga Mundial de Surfe (WSL)? Ele escolheu cuidar da saúde mental. Vimos o mesmo acontecer nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Nem os atletas estão imunes aos efeitos de estresses emocionais. É a mesma coisa no ambiente de trabalho, especialmente em um cenário pós-traumáticos da pandemia. Felizmente, as empresas e algumas políticas estão começando a prestar um suporte mais holístico. O trabalhador com síndrome de burnout passou a ter direito a licença médica remunerada por um período de até 15 dias de afastamento. A Ambev criou uma diretoria para tratar da saúde mental dos colaboradores. O amadurecimento no entendimento sobre o trabalho flexível é outra transformação. Não é só a rotina do trabalhador que importa. É preciso olhar para a situação de toda a família. O trabalho flexível não envolve apenas conseguir trabalhar onde quiser, mas quando puder. As empresas que entenderem a responsabilidade que têm sobre as pessoas, em todas as classes sociais, vão se destacar.

O Fórum: Pensamento Digital é uma coprodução MIT Sloan Review Brasil e Accenture.

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Autoria

Rodrigo Oliveira

É colaborador de MIT Sloan Review Brasil.

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