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Inovação

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Criar mercados para enfrentar o “paradoxo da educação brasileira”

As inovações criadoras de mercado são uma opção mais rápida e fácil para melhorar os resultados na área

Colunista Christimara Garcia e Efosa Ojomo

Christimara Garcia e Efosa Ojomo

25 de Julho

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Artigo Criar mercados para enfrentar o “paradoxo da educação brasileira”

O Brasil gasta mais dinheiro em educação do que seus pares latino-americanos. Porém, grande parte do resultado de seu sistema educacional é inferior ao dos demais, e o progresso tem sido lento. Essa incompatibilidade de gastos versus resultado é o que chamamos de “paradoxo da educação brasileira”.

Uma das soluções apontadas para acelerar o progresso costuma ser a da criação de um sistema único de educação nos moldes do Sistema Único de Saúde (SUS). Mas, desde 2013, o governo brasileiro trabalha para implementar um Sistema Nacional de Educação, e agora isso não saiu do campo das ideias – as várias partes interessadas continuam a discordar sobre detalhes do sistema e como implementá-lo.

Outra solução importante, embora menos discutida, é a inovação criadora de mercados, justamente o tema desta coluna. Com projetos inovadores alavancados por investimentos privados, o País pode ir melhorando os resultados em seu sistema educacional enquanto aguarda a chegada do Sistema Nacional de Educação ou por alguma outra mudança fundamental no sistema.

Existem muitas oportunidades de criação de mercado e, para inspirar o movimento nessa direção, selecionamos os casos de quatro organizações que já estão fazendo isso:, Mind Lab, Descomplica, eduK e Árvore Educação, já estão tendo um impacto significativo. Conheça um pouco sobre elas.

Mind Lab e o mercado de competências cognitivas

A Mind Lab, fundada em Israel em 1994 e presente no Brasil desde 2006, pesquisa, projeta e implanta tecnologias educacionais inovadoras para o desenvolvimento de habilidades e competências cognitivas, sociais, emocionais e éticas. Sua missão é melhorar os resultados de aprendizagem, independentemente do histórico socioeconômico.

A internet é um dos principais ambientes com que a Mind Lab trabalha, mas ela cria mercado também – ou até principalmente – por um serviço que alcança quem não tem conexão com rede em parceria com as escolas. Estas integram as habilidades em sua infraestrutura.

Funciona assim: uma escola se inscreve para o programa Mind Lab, e, automaticamente, alunos, famílias e professores ganham uma caixa física com materiais. Cada caixa contém um livro de família, livros estudantis e uma biblioteca de jogos (um livro que contém todos os jogos do Mind Lab). O programa também fornece ativos digitais, como jogos online, versões digitais dos livros e testes socioemocionais – que podem ser utilizados na escola.

Até o momento, mais de 10 mil escolas e 5,6 milhões de estudantes e famílias no Brasil usaram os serviços da Mind Lab. Vários estudos foram realizados sobre o impacto dessa metodologia. Um deles, feito pela Yale University, mostrou que a Mind Lab melhorou a proficiência em leitura e matemática.

Descomplica e o mercado dos cursinhos inclusivos

Com um coeficiente de Gini de 48,9, o Brasil é um dos países mais desiguais da América Latina. O ensino superior poderia ser um grande equalizador, mas no Brasil ele acentua a desigualdade, em vez de diminuí-la. Ir bem no Enem, principal porta de entrada para as instituições de ensino superior de alto nível no País, pode mudar a trajetória da vida de um aluno, mas as chances de um estudante de baixa renda ter sucesso no teste e frequentar a universidade são pequenas. Esse é um dos problemas que a Descomplica pretende resolver.

A Descomplica surgiu em 2011 oferecendo aulas preparatórias para ajudar a nivelar as oportunidades para estudantes socioeconomicamente desfavorecidos. A plataforma desenvolveu uma solução online acessível que se adapta ao estilo de vida dos alunos. Oferece aulas ao vivo durante todo o dia para acomodar a programação dos alunos. São mais de 15 mil vídeos online e monitoria para problemas específicos.

A organização oferece um modelo gratuito e um de assinatura paga, que sai por cerca de R$ 25 por mês. Quase 90% dos estudantes da Descomplica são de famílias com renda mensal inferior a R$ 5 mil.

Árvore Educação e o mercado de leitura ativa

As estatísticas de leitura do Brasil são desanimadoras. Embora a taxa de alfabetização do Brasil ultrapasse 90%, apenas 8% da população economicamente ativa pode ler e interpretar um texto. Mais de 55% das escolas brasileiras não têm acesso a uma biblioteca.

A Árvore Educação, fundada em 2014, está trabalhando para mudar isso, oferecendo acesso a ofertas de leitura, em português e inglês – livros e notícias – em sua plataforma de leitura. Escolas e agências governamentais podem ter acesso à biblioteca digital com uma assinatura.

Antes da pandemia, a Árvore atendeu 200 mil alunos em 400 escolas. Após a covid-19 ter mandado milhões de estudantes para casa e exposto ainda mais as desigualdades brasileiras na educação, a empresa passou a atender mais de 1 milhão de estudantes em todo o país.

eduK e o mercado de educação para empregabilidade

O desemprego no Brasil mais que dobrou nos últimos dez anos. Pior é o fato de que quase 6 milhões de pessoas desistiram de procurar trabalho porque não acreditavam que poderiam encontrar um emprego.

A plataforma eduK, fundada em 2013, foi projetada para reverter essa tendência como um “one stop shop” para geração de renda, especialmente para brasileiros que atualmente estão desempregados ou subempregados. Atualmente, ela abriga 3.200 cursos, 1.100 especialistas e mais de 8 milhões de inscritos. O serviço custa cerca de R$ 250 por uma assinatura anual.

Quando os usuários entram na plataforma, eles escolhem entre várias opções de trabalho como gostariam de gerar renda. Para quem precisa, a plataforma recomenda cursos para ajudá-los a adquirir as habilidades necessárias para trabalhar na área que escolheram.

Uma vez que uma pessoa está conectada a um trabalho (também aplicável se a pessoa é autônoma), eduK trabalha com ela para criar uma trilha de conhecimento que a ajude a adquirir mais habilidades para que ela possa avançar em sua carreira. Por exemplo, digamos que Thiago consiga um emprego como motorista de entrega, mas um dia quer ter sua própria empresa de distribuição e logística. eduK o capacita com as habilidades para ajudá-lo a alcançar seus objetivos.

Até o momento, mais de 100 mil pessoas concluíram cursos na eduK. Mais de 22 mil conseguiram novas fontes de renda. Há quase 40 empresas inscritas para preencher vagas de emprego.

ESSAS STARTUPS TÊM IDADES variando entre 8 e 16 anos, mas é possível considerar que estão colhendo resultados de alto impacto em um tempo relativamente curto e num setor altamente complexo. Então, te convidamos a parar e refletir: assim como essas empresas conseguiram fazer inovações criadoras de mercado na educação brasileira, a sua não pode fazer algo parecido?

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Colunista Christimara Garcia e Efosa Ojomo

Christimara Garcia e Efosa Ojomo

Efosa Ojomo é um pesquisador sênior no Clayton Christensen Institute, onde lidera a pesquisa do núcleo de Prosperidade Global. Já Christimara Garcia é a fundadora da Catalyze Innovations Initiative, um Action Tank com a missão de promover inovações criadoras de novos mercados no Brasil. Efosa e Christimara desenvolvem uma parceria entre o Clayton Christensen Institute e a Catalyze Innovations Initiative com o intuito de ilustrar o poder que as inovações criadoras de mercado têm sobre organizações e sociedade na promoção de desenvolvimento socioeconômico e da prosperidade.

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