fb

Tecnologia e inovação

17 min de leitura

DeSci: a descentralização da ciência

É uma alternativa confiável, com projetos em estágios iniciais e que aproveita as ferramentas baseadas em blockchain, como contratos inteligentes e tokens, em prol do avanço científico

Colunista Tatiana Revoredo

Tatiana Revoredo

16 de Junho

Compartilhar:
Artigo DeSci: a descentralização da ciência

A atual economia de pesquisa científica incentiva o prestígio ao invés da transparência e inovação. Como introduzir novos mecanismos de coordenação, incentivo e verificação para solucionar as falhas do modelo tradicional de pesquisa?

Neste artigo, veremos como DeSci (decentralized science), que já conta com 85 projetos em operação, pode ajudar a mudar este cenário, possibilitando construtores, investidores, pesquisadores e membros da comunidade participarem de economias em crescimento e promoverem o desenvolvimento científico.

O atual sistema de pesquisa científica

O conhecimento científico sustenta o desenvolvimento tecnológico e o crescimento econômico. E por isso, ele é um bem público. No entanto, no modelo atual de pesquisa científica sobram ineficiências. Primeiro, porque a atual “economia da pesquisa científica” incentiva o prestígio ao invés da transparência e da inovação, necessárias à prosperidade de qualquer empresa e país.

Os pesquisadores devem participar de um sistema com instituições de pesquisa, o desalinhamento de revisores (que não participam do processo e rejeitaram muitas das publicações vencedoras do Prêmio Nobel) e editoras acadêmicas.

O sistema é perturbado por problemas que podem ser categorizados em três pilares principais:

  • Tomada de decisão e financiamentos centralizados.
  • Pobre metodologia e transparência de dados.
  • Revisão não incentivada e publicação controlada.

1. Tomada de decisão e financiamento centralizados

A pesquisa tradicional é mais frequentemente financiada por subsídios do governo ou pesquisas conduzidas por empresas com pequenos grupos de tomadores de decisão. Ambos mostram viés inerente para o quê e para quem recebe financiamento.

O que serve como um negativo ciclo de feedback em que os pesquisadores adaptam os trabalhosos pedidos de financiamento para casos que eles consideram mais prováveis de serem selecionados, às custas daqueles pelos quais estariam mais motivados.

Como resultado, bilhões de dólares são destinados, por exemplo, ao financiamento de uma única teoria para a pesquisa de Alzheimer, enquanto ideias promissoras continuam sem financiamento.

2. Metodologia pobre e opaca transparência de dados

A má ciência pode ser perpetuada, pois os pesquisadores devem “publicar ou ceder” para garantir emprego e financiamento.

Some-se a isto o fato de que a falta de transparência em torno dos conjuntos de dados e metodologias torna difícil, senão impossível, que outros verifiquem ou desenvolvam os resultados existentes.

E tal levou à “crise de replicação”, onde se estima que mais de 50% dos trabalhos de pesquisa são irreprodutíveis e 85% dos gastos com pesquisa biomédica são desperdiçados em estudos redundantes e mal projetados.

3. Revisão não incentivada e publicação controlada

Os manuscritos científicos devem passar pela revisão de pequenos grupos de colegas não remunerados a serem considerados para publicação. O que leva a grandes atrasos na publicação, tendência a ideias concorrentes e falta de atenção a detalhes.

Não à toa, os inúmeros escândalos envolvendo relatórios falsos e imagens adulteradas, e manipulações tiveram reflexos no número de artigos retratados, que aumentou dez vezes na última década. E o pior é que o público deve pagar duas vezes pela pesquisa científica. Primeiro, por meio do dinheiro dos impostos que financiam os estudos; e depois, por meio de assinaturas de editores para acessar os resultados. Isto sem falar na margem de lucro de uma editora que varia entre 20% a 50%.

O chamado para a ciência aberta

Em resposta a essas questões, o movimento open science surgiu com a ascensão da internet. Desde então, pioneiros como a Open Science Foundation passaram a emitir badges para pesquisadores que publicam manuscritos com dados e metodologias abertas.

Tal movimento usa ferramentas de coordenação web2 e depende em grande parte de voluntários e doações. Embora várias organizações de ciência aberta estejam atuantes ainda hoje, muitas têm lutado para manter as operações ou manter os custos baixos para os usuários finais - pesquisadores e leitores – via:

  • Sci-Hub: um site de acesso aberto cujo fundador publica estudos de vários periódicos. A plataforma é considerada ilegal e enfrenta constantemente a ameaça de ser derrubada.
  • Experiment: um site de crowdfunding de projetos para pesquisadores independentes. A plataforma conta com um membro da equipe por projeto para revisar os envios, e cobra uma taxa de plataforma de aproximadamente 8% e 13% para processamento de pagamentos.
  • PLOS: um editor de acesso aberto que inevitavelmente deve empurrar os custos de pessoal e manutenção do site para os candidatos. As taxas de publicação em PLOS podem atrasar os autores em um valor semelhante aos periódicos tradicionais.

De fato, a ciência aberta foi um passo na direção certa, mas depois de 20 e poucos anos, se tornou evidente para muitos construtores a necessidade de ferramentas adicionais de coordenação, incentivo e verificação para que fosse possível a próxima onda de open science. E foi neste contexto que surgiu a DeSci.

O que é e porque DeSci?

A ciência descentralizada, ou DeSci, é um movimento crescente que tem como objetivo aproveitar as tecnologias emergentes, como blockchain e web 3.0, para aprimorar a ciência moderna, avançar a pesquisa científica e ajudar a resolver desafios de longa data em áreas como financiamento, pesquisa, revisão por pares e publicação.

Também é uma de suas metas promover maior transparência e descentralização nos processos científicos.

A DeSci baseia-se no princípio da descentralização e faz uso de ferramentas como NFTs, contratos inteligentes e DAOs para afastar a ciência do controle de entidades centralizadas, como instituições de pesquisa e governos.

Além disso, a ciência descentralizada tem como objetivo desenvolver um sistema de publicação científica distribuído e confiável, de modo que a função de editores e revisores tradicionais se torne obsoleta, fazendo com que a revisão por pares se torne mais transparente e simplificada.

Esse modelo pode incentivar os pesquisadores a compartilhar abertamente seu trabalho e, ao mesmo tempo, permitir que o conhecimento científico seja acessível a todos.

Quase 50 projetos DeSci foram lançados só em 2022, e o capital inicial está começando a aparecer. Belos exemplos são o apoio da Pfizer à pesquisa de medicamentos e longevidade através do VitaDAO, e o apoio do Balaji ao Scholar e ao DBDAO.

Tais projetos são oportunidades para que construtores, investidores, pesquisadores e membros da sociedade participem de economias em crescimento e promovam o desenvolvimento da pesquisa científica.

Como funciona a ciência descentralizada?

A tecnologia blockchain possui o potencial de revolucionar a ciência e reestruturar muitas das práticas desatualizadas do atual modelo de pesquisa científica.

DeSci elimina a necessidade de “revisores” e permite que os cientistas trabalhem com mais liberdade, ao mesmo tempo em que compartilham conhecimento com outras pessoas da comunidade e promovem maior colaboração. Isso, por si só, pode abrir caminho para grandes avanços no futuro.

Através da tecnologia blockchain, pesquisadores podem criar bancos de dados abertos, imutáveis, indeléveis e resistentes à censura, que também podem ser um registro preciso da propriedade de suas descobertas científicas.

Além disso, o uso de tokens na ciência descentralizada também pode ser uma ferramenta valiosa para ajudar a financiar projetos, permitindo que qualquer pessoa se torne um patrocinador ou investidor. O que ajuda a reduzir a dependência da ciência em relação ao financiamento público ou institucional.

A integração de contratos inteligentes à pesquisa e ao desenvolvimento científico pode trazer inúmeros benefícios, ajudando a simplificar todo o ecossistema.

Além de tudo isso, na convergência de todas essas três tecnologias, existem organizações autônomas descentralizadas (DAOs) que aproveitam o poder da comunidade para promover o desenvolvimento científico. As DAOs podem ser particularmente importantes para chamar a atenção para tópicos pouco estudados e financiar pesquisas.

Abaixo uma visão geral de como DeSci poderia contribuir para melhorar o ecossistema científico:

Ciência Descentralizada (DeSci) Ciência Tradicional
1. A distribuição de fundos é determinada pelo público usando mecanismos como doações quadráticas ou DAOs. Grupos pequenos, fechados e centralizados controlam a distribuição de fundos.
2. Você colabora com colegas de todo o mundo em equipes dinâmicas. As organizações de financiamento e as instituições de origem limitam suas colaborações.
3. As decisões de financiamento são tomadas on-line e de forma transparente. Novos mecanismos de financiamento são explorados. As decisões de financiamento são tomadas com um longo tempo de resposta e transparência limitada. Existem poucos mecanismos de financiamento.
4. O compartilhamento de serviços laboratoriais é facilitado e mais transparente com o uso de premissas da Web3. O compartilhamento de recursos laboratoriais geralmente é lento e opaco.
5. Podem ser desenvolvidos novos modelos de publicação que usam premissas da Web3 para confiança, transparência e acesso universal. Você publica por meio de caminhos estabelecidos, frequentemente reconhecidos como ineficientes, tendenciosos e exploradores.
6. Você pode ganhar tokens e reputação por revisar trabalhos por pares. Seu trabalho de revisão por pares não é remunerado, beneficiando editoras com fins lucrativos.
7. Você detém a propriedade intelectual (PI) que gera e a distribui de acordo com termos transparentes. Sua instituição de origem é proprietária do IP que você gera. O acesso ao IP não é transparente.
8. Compartilhamento de toda a pesquisa, inclusive os dados de esforços malsucedidos, com todas as etapas on chain (na rede blockchain). Viés de publicação significa que os pesquisadores têm maior probabilidade de compartilhar experimentos que tiveram resultados bem-sucedidos.

O progresso da DeSci

A DeSci está revolucionando o ciclo de vida da pesquisa científica tradicional, combinando os princípios fundamentais da ciência aberta com novos mecanismos de coordenação e mecanismos de incentivo.

O ecossistema DeSci possui uma ampla variedade de projetos que abordam algumas ou todas as partes da economia da pesquisa. Veja um panorama do ecossistema DeSci aqui.

Ecossistemas de pesquisa incentivados por tokens, como o Research Hub, abordam vários pares do ciclo de vida científico. Outros projetos DeSci estão construindo uma área de foco principal e podem se integrar modularmente a outros projetos. Independente da forma (modular ou monolítica), todo projeto DeSci busca contribuir para o progresso científico:

  • Democratizando o financiamento.
  • Aumentando a transparência do método e dos dados.
  • Incentivando a revisão.
  • Promovendo o acesso aberto ao conhecimento científico.

Como DeSci democratiza o financiamento científico?

1) DAOs ajudam neste processo

DeSci promove a tomada de decisão baseada na comunidade para financiar pesquisas, principalmente por meio das organizações autônomas descentralizadas (DAOs).

Muitas DAOs têm específicas áreas de foco, financiando pesquisas sobre longevidade como o VitaDAO e sobre exploração espacial como o FrontierDAO.

Outros, como VibeBio planejam financiar uma série de soluções médicas determinadas por suas comunidades.

Note que colocar as decisões de financiamento nas mãos das próprias comunidades promove o desenvolvimento de soluções personalizadas e direcionadas que muitas vezes são negligenciadas em configurações tradicionais voltadas apenas ao lucro. Veja como funciona a economia de DeSci via DAO aqui.

2) Atuação dos mecanismos de coordenação e acréscimo de valor

DAOs de financiamento geralmente se coordenam em torno de tokens de governança infungível (NFTs) para inicializar um tesouro e votar em iniciativas de pesquisa.

Elas também podem obter financiamento e doações externas, como da Gitcoin, que realizou sua última rodada de financiamento DeSci de julho a setembro de 2022.

Para sustentar as operações, os DAOs podem monetizar a propriedade intelectual (PI) gerada a partir da pesquisa que financiam.

— IP-NFTs: alternativa única às patentes tradicionais

IP-NFTs foram lançados pela Molecule em agosto de 2021, e possuem a função de proteger legalmente o IP gerado a partir de estudos de pesquisa.

Os IP-NFTs são uma alternativa única às patentes tradicionais que servem para acumular e restringir dados e limitar a velocidade das descobertas científicas, e permitem que os DAOs monetizem seu trabalho de várias maneiras:

  • Licenciamento IP para comercialização por outras entidades.
  • Fracionamento da propriedade com sócios.
  • Negociação de dados em mercados abertos e mantenha os royalties do criador.
  • Retenção de garantia para tomar emprestado.

Eles também possibilitam novos mecanismos de coordenação de pesquisa, como controle de acesso para participantes verificados para contribuir com estudos e receber compensação.

Os prós e contras da DeSci

1) Pontos favoráveis da descentralização da pesquisa científica

  • Métodos de pesquisa e conjuntos de dados transparentes.
  • Mecanismos de coordenação e acréscimos de valor.
  • Revisão por pares incentivada e publicação aberta.
  • Integração de dados, ferramentas e infraestrutura.

1.1) Métodos de pesquisa e conjuntos de dados transparentes

DeSci pode aclarar como os estudos são estruturados e conduzidos. Neste ponto, muitos DAOs de financiamento utilizam entidades externas, como organizações de pesquisa contratadas (CROs) para atender a consultas de pesquisa, embora haja várias organizações de pesquisa focadas em DeSci.

Como exemplo, os membros do LabDAO podem iniciar e participar de projetos de pesquisa e compartilhar serviços e ferramentas, e o in real lab (IRL) é uma biologia molecular focada em espaço de coworking DeSci.

1.2) Mecanismos de coordenação e acréscimo de valor

Os IP-NFTs são um exemplo de como os contribuidores podem descobrir e participar de projetos de pesquisa financiados por DAOs. O mercado Molecule combina projetos com potenciais investidores, e os resultados podem ser adicionados como metadados IP-NFT.

Veja como é o processo para montar um IP-NFT, aqui (fonte: Molecule).

Em paralelo, temos o OpSci que adota uma abordagem diferente ao tokenizar a identidade, credenciais e projetos de pesquisadores ou grupos independentes como NFTs de certificado de impacto.

Os “certificados de impacto” serão emparelhados com outros protocolos como Holonym para identidade descentralizada e verificação de credenciais como Hypercerts para rastrear métodos de pesquisa e progresso.

Hypercerts são tokens ERC-1155 que representam métodos de pesquisa, conjuntos de dados e realizações. Os pesquisadores podem conseguir financiamento em uma plataforma aberta, exibindo de forma transparente os detalhes de seu trabalho ao longo do tempo. Os direitos de propriedade sobre conjuntos de dados transparentes são protegidos conforme verificado no registro aberto.

1.3) Revisão por pares incentivada e publicação aberta

Grupos de pesquisadores e projetos podem ser tokenizados junto com seus conjuntos de dados, métodos e resultados. O que também se aplica para as publicações científicas.

Em DeSci, o atual sistema de publicação de periódicos (onde usuários devem pagar para fazer upload ou acessar relatórios científicos) é substituído por uma camada de dados sem permissão e taxas de marketplaces. As taxas são abstraídas para aqueles que desejam comprar ou vender direitos de propriedade de estudos.

Deste modo, os pesquisadores podem exibir livremente suas publicações, bem como os NFTs podem ser visualizados livremente em marketplaces como o OpenSea.

Além disso, existe mais flexibilidade no processo de revisão, pois os pesquisadores podem aproveitar protocolos independentes de revisão por pares.

Nessa linha, o projeto Ants-Review propõe um protocolo de revisão por pares incentivado na blockchain Ethereum, onde os membros da comunidade mantêm comitês de revisores profissionais pagos responsáveis. Os pesquisadores pagam o protocolo para ter um estudo revisado, mas o pagamento só é liberado para os revisores se a comunidade determinar por voto que os requisitos de uma revisão completa foram atendidos.

Com relação à revisão de publicações, o aplicativo DeSci Nodes do DeSci Labs possibilita que pesquisadores habilitados criem e publiquem seus objetos de pesquisa para FAIR, em um repositório descentralizado de estado aberto. Objetos de pesquisa representam publicações, códigos, conjuntos de dados, vídeos e muito mais, e estão conectados para reprodutibilidade e replicabilidade.

Todos os componentes da pesquisa são citáveis e acumulam crédito de volta a um único ponto por meio de um identificador persistente vinculado, e um sistema de resolução descentralizado. Os desenvolvedores podem criar aplicativos sobre essa camada de dados abertos para implementar mecanismos personalizados de coordenação e acúmulo de valor. Tais aplicativos podem se integrar modularmente com outras partes da pilha DeSci – por exemplo, usando os resultados da revisão por pares do Ants-Review e certificados de impacto OpSci para verificar a identidade e o histórico de trabalho.

1.4) Integração de dados, ferramentas e infraestrutura

DeSci depende de dados e protocolos como data lake, cureDAO e fleming protocol que permitem que pessoas monetizem seus dados pessoais de saúde e registros médicos para compra por pesquisadores.

Com o DB DAO, organizações autônomas descentralizadas podem gerenciar os conjuntos de dados (que coletam ao tokenizar cada linha em um banco de dados) como um NFT, e os contribuidores recebem taxas de consulta quando seus dados são acessados.

Avançando um pouco no ciclo de vida da pesquisa, DeSci NFTs – IP-NFTs, certificados de impacto, hypercerts, objetos de pesquisa, etc. – são armazenados em soluções descentralizadas, incluindo IPFS e arweave.

Projetos como Bacalhau, permitem que os usuários executem trabalhos de computação diretamente onde os conjuntos de dados são armazenados (“compute over data”).

Note que cada trabalho gera um identificador de conteúdo exclusivo (CID) no IPFS, que cria links prováveis entre conjuntos de dados, suportando a reprodutibilidade. Bacalhau também ajuda a simplificar os fluxos de trabalho dos pesquisadores, pois o download de grandes conjuntos de dados localmente costuma ser impraticável.

Por fim, os serviços de ferramentas DAO, como os oferecidos pela bio.xyz, uma plataforma de lançamento derivada do Molecule, ajudam DAOs DeSci a se firmarem.

2) Os contras de DeSci (desafios e riscos)

2.1) Riscos atuais

  • Ecossistema em expansão testado caso a caso.
  • A maioria dos protocolos ainda não foi totalmente lançada na rede principal.

2.2) Desafios futuros

  • Direitos de propriedade intelectual.
  • Verificabilidade de identidade e dados.
  • Replicação da pesquisa.
  • Conformidade regulamentar.

No tocante aos riscos atuais, importante destacar que DeSci é um ecossistema em expansão, ainda é testado caso a caso. A maioria dos projetos DeSci (78%) teve início no quarto trimestre de 2021, coincidindo com o pico de alta do mercado cripto. E o aumento nos lançamentos de projetos DeSci coincidiu com a primeira 'DeSci jam session', realizada em uma conferência Ethereum durante a LisCon em outubro de 2021.

Outro risco é que a maioria dos protocolos ainda não foi totalmente lançada na rede principal. Existem vários projetos de ecossistema DeSci em desenvolvimento, e ainda não se sabe quais projetos terão sucesso em capturar valor e sustentar as operações.

Quanto aos desafios futuros, estes vão desde direitos de propriedade intelectual e verificabilidade à reprodutividade e conformidade regulamentar.

Direitos autorais são desafios porque a realização de pesquisas não garante necessariamente resultados úteis. Isto é, as comunidades IP-NFT podem não conseguir monetizar o IP, o que afetará seus resultados.

Ainda, se estiver trabalhando com instituições de pesquisa, a negociação de direitos de propriedade intelectual pode exigir um esforço significativo no financiamento de DAOs. Isto porque, as instituições tradicionais estão acostumadas a ficar com receber porções significativas da propriedade intelectual produzida pelos pesquisadores em sua organização.

Outro desafio é a verificabilidade. Protocolos descentralizados de verificação de identidade e dados ainda estão engatinhando. E até atingirem maturidade, existem riscos de pesquisadores alterarem suas qualificações para atrair financiamento e potencialmente promover resultados ilegítimos.

Por outro lado, métodos e conjuntos de dados abertos e verificáveis podem levar a uma melhor reprodutibilidade. Todavia, a replicação da pesquisa ainda não foi incentivada, e projetos como DeSci Labs e Scholar ainda estão nas fases iniciais de construção de um protocolo para incentivar estudos de replicação.

Por fim, há o desafio da conformidade regulamentar. O armazenamento de dados em redes descentralizadas como IPFS ou arweave pode não ser considerado compatível com nossa lei geral de proteção de dados (LGPD), o GDPR europeu, ou o HIPAA americano. Logo, projetos precisarão trabalhar em conjunto com reguladores para estabelecer a legalidade em torno das práticas DeSci.

Apenas enfrentando tais riscos e desafios será possível trazer legitimidade à economia DeSci e atrair ainda mais financiamento, desenvolvimento de aplicativos e participação em pesquisas.

Takeaway

A maioria dos projetos DeSci ainda se encontra em estágios iniciais. No entanto, é inegável como DeSci está emergindo rapidamente como uma alternativa confiável à forma como a ciência tradicional funciona, oferecendo aos pesquisadores e cientistas caminhos para maior propriedade sobre dados científicos e propriedade intelectual, oportunidades de financiamento, revisão por pares mais transparente e acesso aberto a toda a comunidade.

Mas, e você? Compreendeu como a ciência descentralizada aproveita as ferramentas baseadas em blockchain, como contratos inteligentes e tokens, para fazer a ciência avançar e alcançar avanços que antes eram considerados como estando a décadas de distância, ou mesmo impossíveis de serem alcançados?

Conhecimento é poder. Nos vemos em breve!

Compartilhar:

Colunista

Colunista Tatiana Revoredo

Tatiana Revoredo

Tatiana Revoredo é LinkedIn Top Voice em Tecnologia e Inovação. Especialista em aplicações de negócios Blockchain pelo MIT Sloan School of Management, em Inteligência Artificial pelo MIT CSAIL, em estratégia de negócios em Inteligência Artificial pelo MIT Sloan School of Management e em Cyber-Risk Mitigation pela Harvard University. Estrategista Blockchain pela Saïd Business School, University of Oxford. Professora do curso Blockchain para negócios no Insper. Autora de três livros “Blockchain- Tudo o Que Você Precisa Saber”, “Bitcoin, CBDC, Stablecoins e DeFi”, e “Cryptocurrencies in the International Scenario”.

Artigos relacionados

Imagem de capa Aceite as limitações dos LLMsAssinante

Tecnologia e inovação

19 Dezembro | 2023

Aceite as limitações dos LLMs

Superestimar a capacidade dos grandes modelos de linguagem, como o ChatGPT, pode levar a resultados pouco confiáveis. Para lidar melhor com eles, é importante entender primeiro como funcionam

Mikhail Burtsev, Martin Reeves e Adam Job
Imagem de capa Open source contra os hackers da IA generativaAssinante

Tecnologia e inovação

19 Dezembro | 2023

Open source contra os hackers da IA generativa

A contratação de serviços de inteligência artificial pode expor seus dados e deixar sua empresa nas mãos das big techs. Mas existem alternativas. Estamos vivendo o início de uma fase semelhante à que deu origem ao Linux nos anos 1990, quando desenvolvedores do mundo todo se dedicaram a enfrentar os desafios da nova tecnologia com soluções de código aberto, disponíveis para todos – e veja cinco modos de administrar os respectivos

Aron Culotta e Nicholas Mattei
Imagem de capa Como aplicar IA generativa na inovação corporativaAssinante

Tecnologia e inovação

17 Dezembro | 2023

Como aplicar IA generativa na inovação corporativa

A nova tecnologia pode trazer eficiência e criatividade para a inovação em grandes empresas. Uma pesquisa recente mostra a realidade brasileira, os estágios de adoção em diversos setores, as oportunidades no horizonte e as barreiras de adoção

Maximiliano Carlomagno e Felipe Scherer
Imagem de capa Gestão pública 4.0: tecnologia para atender as demandas dos cidadãos

Tecnologia e inovação

15 Novembro | 2023

Gestão pública 4.0: tecnologia para atender as demandas dos cidadãos

A transformação digital pode ajudar na revolução da gestão municipal, melhorando a eficiência das instituições e fortalecendo a participação cidadã e a prestação de serviços mais ágeis, a partir dos aplicativos governamentais multiplataformas

Ana Debiazi e Aryana Valcanaia

2 min de leitura