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Inovação

3 min de leitura

Precisamos falar sobre computação quântica

É preciso entender o paradigma – completamente novo – e suas possíveis aplicações. Em um período de três a cinco anos, sistema comercialmente relevantes já devem estar entre nós

Rodrigo Parreira

12 de Novembro

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Artigo Precisamos falar sobre computação quântica

Talvez nenhum desenvolvimento tecnológico represente melhor a aplicação da mecânica quântica do que o computador. Essa área da física, surgida no princípio do século 20, dedica-se a entender o comportamento da matéria em escala subatômica. Pioneiros como Max Planck e Erwin Schrödinger perceberam que a visão clássica da física falhava, gerando contradições que não podiam ser explicadas. Uma parte significativa do esforço de pesquisa básica em física no último século refere-se a entender, estender e completar a mecânica quântica.

As aplicações tecnológicas dessa “nova física” não tardaram. Quem sabe a mais notável seja a eletrônica, e, nesse sentido, o impacto desse desenvolvimento está à nossa volta e ainda longe de se esgotar. A invenção do transistor em 1947 trouxe um horizonte de possibilidades que logo desembocou na criação do computador de uso comercial.

Porém, e até mesmo por estar arquitetonicamente vinculada a esse componente, a computação criou toda a base para a construção de sistemas a partir das lógicas binárias – um transístor não passa de uma chave eletrônica que pode ser aberta, permitindo a passagem de corrente, ou fechada, interrompendo seu fluxo. Daí para a concepção de uma lógica baseada em “bits”, que podem assumir valores de 0 e 1, é um passo natural – embora longe de ser trivial! Na linguagem da física, sistemas que podem assumir valores com estados discretos e isolados são chamados de “clássicos”. E é exatamente esse tipo de matemática que está na base do desenvolvimento dos computadores atuais.

Quando falamos de computação quântica, trazemos para a mesa outro paradigma, completamente diferente. Os bits deixam de ser definidos por valores discretos, podendo assumir quaisquer valores entre 0 e 1, obtidos a partir de um conjunto infinito de superposições entre os estados de partida (0 e 1). Esses novos elementos passam, então, a ser chamados de “qubits” (“quantum bits”).

Outro elemento essencialmente quântico associado aos qubits diz respeito ao conceito de “entrelaçamento”. Enquanto bits clássicos são independentes (ou seja, se um bit assume o valor 0, isso é 100% independente do valor que seu vizinho assume), os qubits, até por sua natureza quântica, não o são. Ou seja, o estado assumido por um qubit passa a se relacionar, fisicamente, com os estados assumidos por todos os outros qubits do sistema.

Um computador baseado em qubits é o que hoje se chama de “computador quântico”. Vários centros de pesquisa e empresas ao redor do mundo vêm investindo fortemente no seu desenvolvimento. Anúncios recentes mostram avanços significativos apresentados pela IBM e pelo Google, que investem em sistemas com número cada vez maior de qubits. Sistemas comercialmente relevantes parecem ser uma questão de tempo. Creio que, em um período de três a cinco anos, eles já devem estar entre nós.

Computadores quânticos seriam capazes, por sua lógica única, de armazenar e trabalhar com volumes de informações exponencialmente maiores que os sistemas atuais. Sua aplicação, no entanto, vai muito além da capacidade. Sua arquitetura permite o tratamento de problemas não-acessíveis aos computadores atuais. E talvez a fronteira mais óbvia a ser explorada se refira à simulação de partículas no domínio quântico.

O design de moléculas para aplicações industriais, farmacêuticas e químicas em geral aponta para uma nova revolução tecnológica. Moléculas desenhadas na medida para a cura de determinadas enfermidades e adequadas para a bioquímica específica de cada paciente, para melhorias genéticas em alimentos e para novos materiais, entre tantas outras aplicações, começam a aparecer como possibilidades reais.

No médio prazo, podemos pensar em aplicações que levariam a robótica para outros patamares a partir da simulação de sistemas neurais, além de usos em modelos complexos não-deterministas, como sistemas sociais e econômicos.

Enfim, fica claro que temos novas fronteiras de inovação que devem assumir um papel economicamente muito relevante em um horizonte não muito distante.

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Autoria

Rodrigo Parreira

É CEO da Logicalis na América Latina e PhD em física matemática pela Universidade de São Paulo (USP). Começou sua carreira como pesquisador e professor na Princeton University, nos EUA. Após passagens pela McKinsey do Brasil e pela consultoria espanhola Cluster Consulting, juntou-se ao Grupo Promon em 2000, e, na esteira da fusão da Promon Tecnologia com a Logicalis, em 2008, assumiu a posição de CEO da Logicalis, primeiro no Cone Sul, depois na América Latina.

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