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Sobre conquistas: a América de Colombo e o espaço de Elon Musk

Conquistas do navegador de 1492 e do visionário de 2021 revelam que, além de ambição, é preciso ter fé para alcançar grandes realizações

Colunista Cássio Pantaleoni

Cássio Pantaleoni

26 de Outubro

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Artigo Sobre conquistas: a América de Colombo e o espaço de Elon Musk

O político e promotor norte-americano, Thomas Dewey, certa vez declarou que sentir-se reconhecido, importante e valorizado estão entre as necessidades humanas mais importantes. Difícil discordar. Ainda mais que, com frequência, testemunhamos homens e mulheres se aventurando em conquistas que outros tantos nem sonhariam tentar.

Uma conversa recente com o pesquisador e historiador Mario Caldonazzo, enquanto ele me explicava detalhes da história de Cristóvão Colombo, motivou uma comparação, talvez despropositada, entre o descobridor da América e os conquistadores do século 21, como Elon Musk, por exemplo.

Caldonazzo explicava que “Cristóvão Colombo se lançou ao mar aos 14 anos, em viagens de navios comerciais que cruzavam o mediterrâneo. Aos 21 ou 22 anos de idade, já era capitão de uma galera”.

Guardadas as peculiaridades de cada época, Musk também muito cedo alcançou algo incomum. Aos 12 anos, de modo autodidata, aprendeu programação de computadores e desenvolveu o primeiro código de um jogo em basic, que vendeu por US$ 500.

No entanto, para os jovens Cristóvão e Elon, nem tudo foi realização contínua. Um e outro tiveram alguns reveses bastante cedo.

Lembrei da infância de Musk, enquanto Caldonazzo me explicava que “Com 25 anos, Colombo navegava de Gênova para a Inglaterra formando parte de uma frota comercial de cinco barcos, dois dos quais eram da empresa Spinola-Di Negro. Próximo de Portugal, foram atacados por piratas, e o navio em que Colombo viajava ficou em chamas, obrigando-o a se lançar ao mar; e ele só chegou na costa portuguesa porque se agarrou a um pedaço de madeira dos destroços”.

O idealizador da Tesla não enfrentou piratas e nem teve que brigar com as chamas de algum navio, porém na terra onde nasceu, a África do Sul, durante a infância, sofreu muito bulling. Metaforicamente, ele também se jogou ao mar, agarrado à cidadania canadense da mãe, para alcançar Ontário. Foi no Canadá que, de modo a se estabilizar, se empenhou em atividades braçais, como plantações, corte de madeira e limpeza de caldeiras industriais.

Há, entretanto, mais semelhanças entre estas duas personagens: “Colombo sempre demonstrou ao longo de sua vida um propósito claro de alcançar uma posição de honra e riqueza o que provavelmente foi o impulso para seus ideais de navegação”, explicava-me Mario Caldonazzo. Não muito diferente dos propósitos de Musk, que aos 24 anos mudou-se para a Califórnia para buscar um doutorado em Stanford – e abandonou a empreitada dois dias depois de matriculado. O título era pouco para alguém que aspirava empreender o mais rapidamente possível.

E se mais tarde Musk viria a explorar ideias de acesso ao espaço, desconsiderando programas aeroespaciais dos governos, investindo em meios alternativos e criando a Space X, com Colombo não foi diferente.

“O surgimento na mente de Cristóvão Colombo da ideia da possibilidade de alcançar a Ásia pela via do Ocidente consiste em um mistério que tem ocupado os historiadores, considerando que naquela época as navegações se limitavam a seguir pelo Atlântico costeando a África até entrar no Índico e chegar a Índia, com vista de terra ao lado por quase toda a viagem. Seguir pelo Atlântico – mar tenebroso – pelo oeste era impensável pelo temor do desconhecido”, conta Caldonazzo.

A verdade é que a Space X quase foi a falência. E com Colombo se deu algo similar.

Segundo Caldonazzo: “Após ser recebido por uma junta de matemáticos portugueses escolhida por D. João II, para apresentar seu projeto de navegação, o navegador foi ignorado e considerado um insano com ideias absurdas. Sete anos depois de chegar em Lisboa, agora viúvo e com seu filho Diogo de 7 anos, o genovês deixou Portugal para trás, a fim de levar suas ideias para os reis católicos espanhóis: Fernando II e Isabel I. Chegou sem dinheiro, maltrapilho, solicitando auxílio de monges franciscanos no mosteiro de la Rábida em Palos de la Frontera. O guardião do convento, Frei Antônio de Marchena, que era excelente cosmógrafo, aliás, com reconhecimento entre os letrados e os monarcas, não só apoiou o projeto de Colombo como passou a cuidar de seu filho para que ele pudesse tentar a sorte com os soberanos espanhóis”.

Enquanto o primeiro lançamento da Space X aconteceria quatro anos após a criação da empresa, Colombo precisou esperar sete anos para enfim encontrar apoio: “No mês de janeiro de 1492, Cristóvão Colombo mais uma vez se apresentava na corte dos reis católicos, agora em Santa Fé, nos arredores de Granada em pleno sítio da cidade que era o último reduto muçulmano a cair para que se completasse a reunificação da Espanha. Uma assembleia foi realizada, nas mesmas características da junta de Salamanca, para analisar novamente a solicitação do navegador. Mais uma vez sua proposta foi rechaçada”, contra Caldonazzo.

“No entanto, Juan de Santángel, tesoureiro do reino, argumentou com rainha a possibilidade de grande lucro para a coroa espanhola em caso de sucesso do genovês, e o pouco prejuízo em caso contrário; e se dispôs a financiar o empreendimento. A rainha mandou chamar novamente a Colombo que já deixava a cidade, decidido a ir para a França vender sua ideia. A espera de sete anos do navegador na Espanha, e as dificuldades para convencer os reis católicos a investirem em seu empreendimento, em nada alterou seus objetivos pessoais”, explica Caldonazzo.

Navegações distintas, ambições semelhantes

As ambições desta dupla de empreendedores nunca foram discretas. De um lado, Musk nutre a ambição de popularizar o planeta vermelho – Marte – e torná-lo uma colônia. De outro, Colombo avistava a oportunidade de estabelecer uma rota às Índias mais lucrativa.

No entanto, muito antes de Musk, o famoso navegador acabou por escrever seu nome como protagonista da viagem mais famosa de todos os tempos: “Em agosto do mesmo ano, Colombo partiu da mesma Palos de la Frontera, ali onde havia chegado na Espanha com uma nau e duas caravelas (...)que resultou na descoberta de um continente desconhecido para os europeus, um novo mundo. Posteriormente chamado Américas. As primeiras viagens ao Novo Mundo não resultaram em tantas riquezas como era esperado tanto pelos reis como pelo navegador, mas foram suficientes para que Colombo alcançasse seus objetivos, passando a ser visto como Almirante do Mar Oceano, título reservado apenas à nobreza”, conta o historiador.

“E diferentemente do que é relatado erroneamente em vários livros de história, não morreu pobre, ao contrário, estava rico e rodeado por seus amigos e seus dois filhos; dentre eles Fernando Colombo, nascido na Espanha de um relacionamento passageiro do navegador. Como resultado dos ganhos obtidos por seu pai, Fernando Colombo, pode se dedicar a vida intelectual a ponto de montar a maior biblioteca do mundo durante muito tempo com cerca de 15 mil volumes, e que foi legada após sua morte aos cuidados da Catedral de Sevilha, onde até hoje podem ser encontrados os livros que pertenceram a seu pai na biblioteca Colombina anexa à Catedral”, esclarece Caldonazzo.

Se ora Musk empenha-se na obtenção de fundos para seus planos com Marte, abastecendo a Estação Espacial Internacional com seus foguetes que podem pousar após decolarem, tendo a NASA como um de seus principais clientes, isso demonstra que, no caminho de todo o empreendedor, não basta a determinação de fazer, mas também a de convencer que o custo do impossível, na verdade, é um investimento no possível.

Alguns poderão advogar que o navegador de 1492 e o visionário de 2021 não estão em busca de reconhecimento ou que não visavam a valorização pública de seus feitos; no entanto, esse argumento é abastante discutível. Colombo e Musk sonharam, cada a um ao seu tempo, em superar suas condições originais, o status quo. Arriscaram tudo sem temer o infortúnio. E mesmo diante de situações desconfortáveis, não deixaram de seguir em frente, com a fé de que o impossível é apenas uma hipótese que ainda não foi refutada.

A lição é que, sejamos Colombo ou Musk, precisamos ter a fé que nos move para qualquer lugar, quer seja um novo continente, um planeta vermelho ou a próxima conquista.

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Colunista Cássio Pantaleoni

Cássio Pantaleoni

Cássio Pantaleoni é managing director da Quality Digital e membro do conselho consultivo da ABRIA (Associação Brasileira de Inteligência Artificial). Tem mais de 30 anos de experiência no setor de tecnologia, é graduado e mestre em filosofia, e reúne experiências empreendedoras e executivas no currículo. Vencedor do prestigioso prêmio Jabuti, com a obra Humanamente Digital: Inteligência Artificial centrada no Humano.

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