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Inovação científica

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Telecomando: operações remotas de equipamentos de imagem

O que fez a operação remota de equipamentos de ressonância magnética e tomografia computadorizada surgir como inovação e ser um grande diferencial no Brasil e no mundo?

Colunista Gustavo Meirelles

Gustavo Meirelles

25 de Novembro

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Artigo Telecomando: operações remotas de equipamentos de imagem

Vivemos um momento de grandes desafios de demanda, custos e acesso na área da saúde, levando a uma necessidade de avanços tecnológicos eficientes, seguros e eficazes. Além do envelhecimento da população, a urgência de novas tecnologias no setor muito se deve à pandemia de covid-19, que trouxe uma enorme modificação nas necessidades, demandas e forma de atendimento na área da saúde. A telessaúde ganhou uma força sem precedentes no Brasil e no mundo, com grandes novidades no campo da radiologia e do diagnóstico por imagem.

Temos percebido um aumento constante na demanda por exames de tomografia computadorizada (TC) e de ressonância magnética (RM), que não é acompanhada pela quantidade e distribuição territorial dos equipamentos disponíveis, muito menos pelo número de profissionais qualificados e disponíveis para operá-los, incluindo-se aqui médicos radiologistas, tecnólogos, técnicos e biomédicos.

Dados anteriores aos da pandemia já mostravam, em estudo apresentado na conferência RSNA de 2021, que o crescimento da demanda por exames de imagem nos Estados Unidos tinha sido 5% maior que a capacidade de formação de novos profissionais na área de radiologia (entre 2012 e 2019).

No Brasil, o aumento da demanda é confirmado pelo número crescente de serviços de diagnóstico por imagem. Dados do Painel da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed) de 2021 demonstram que no final de 2020 havia cerca de 24,5 mil estabelecimentos ligados às atividades de serviços de diagnóstico e terapia. Desse total, cerca de 6 mil (24,7%) eram de unidades de serviços de diagnóstico por imagem. O painel aponta um crescimento de mais de 10% no setor nos últimos dez anos.

Contudo, a qualidade, treinamento e educação continuada dos profissionais ainda são um grande desafio, principalmente para aqueles que operam os equipamentos de imagem, que carecem muitas vezes de boa qualificação e treinamento especializado para equipamentos cada vez mais modernos, diversos e dotados de grande número de recursos. Em um hospital, clínica ou centro de imagem geralmente coexistem diversos tipos de máquinas com diferentes tempos de uso, marcas e tecnologias, elevando o grau de dificuldade da capacitação técnica da equipe de operadores.

Outro fator é o crescimento do número de equipamentos de TC e RM no mundo. Dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 2016 a 2021 mostram um aumento no número de equipamentos de TC por milhão de habitantes na ordem de 4,2% nos EUA, 3,4% no Japão e 34,2% no Brasil. Em relação ao número de equipamentos de RM por milhão de habitantes, um aumento de 3,4% nos EUA, 4% no Japão e 40% no Brasil.

Uma das alternativas para esta distribuição desigual de profissionais e máquinas diferentes e em número crescente é a possibilidade de operação e comando remotos dos equipamentos. O fornecimento de serviços de saúde especializados a longas distâncias reduz – mas não elimina – a necessidade da presença física dos operadores, permitindo que profissionais locais estejam totalmente dedicados ao atendimento e à segurança do paciente e o operador remoto fique exclusivamente ocupado com a operação do equipamento. Assim, temos uma abordagem com potencial para aumentar acesso, qualidade e eficiência de todo o processo.

A partir de todos esses pontos, surgiu a necessidade da Diretoria Coletiva da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) adicionar, na sua resolução sobre telerradiologia e comando remoto de equipamentos, uma nova seção. De forma específica, no artigo 70 da resolução, a Anvisa incluiu que “os critérios primários para opção por procedimento telerradiológico devem ser para o benefício e segurança do paciente”.

Há tempos, também, já é discutida a necessidade de melhoria no atendimento aos pacientes submetidos a exames de RM e TC, não só no quesito da qualidade de imagens, mas em toda a jornada do paciente, que envolve o caminho percorrido da percepção dos primeiros sintomas ao início do tratamento. Esta nova abordagem permite uma maior dedicação ao paciente por profissionais da enfermagem, biomédicos e tecnólogos locais, deixando o operador remoto com um foco mais técnico e especialista. Outro aspecto muito relevante é a participação de equipe remota multidisciplinar, focada em várias marcas e protocolos, elevando seu nível técnico e obtendo um caminho mais avançado na sua carreira.

O Brasil é pioneiro na tecnologia de operação remota de equipamentos de RM e TC, existindo no mercado empresas sólidas e extremamente qualificadas prestando o serviço e tendo sido responsáveis pela criação das primeiras operações de telecomando, inclusive com expansão para os EUA e Europa.

A tecnologia relacionada à operação remota, tanto para TC quanto para RM, vem acompanhada da possibilidade de aumento de oferta do número de exames, maior qualidade de atendimento, um número mais amplo de exames realizados e, principalmente, redução da capacidade ociosa de equipamentos de TC e RM instalados em clínicas, hospitais e centros de imagem. Desta forma, é possível a realização de exames em horários e dias alternativos (como períodos noturnos e aos finais de semana), concentrando em um único local a central de operações, com o melhor em termos de qualidade e de capacidade de profissionais muito bem treinados e que operam os equipamentos seguindo protocolos rígidos e constantemente atualizados.

É realidade que a operação a distância leva a uma maior qualidade – pela possibilidade de treinamento e padronização de protocolos – e segurança ao paciente, tanto em relação ao exame quanto ao que é entregue como resultado do processo ao paciente, para isto, é necessária uma série de mudanças no fluxo de trabalho, treinamento das equipes e tecnologias da instituição.

Passos importantes já estão sendo dados no sentido de tornar a operação remota tão ou mais presente do que a operação local, como a atualização do manual de segurança para operação de ressonância magnética, produzido pelo Colégio Americano de Radiologia (ACR – American College of Radiology, na sigla em inglês). Na próxima atualização será incluída a operação remota de RM, como quesito de maior qualidade e segurança para os pacientes.

Da mesma forma, na resolução brasileira RDC nº 611, de 9 de março de 2022, que estabelece os requisitos sanitários para a organização e o funcionamento de serviços de radiologia diagnóstica no país, foi inserida, em seu capítulo III, seção específica sobre telerradiologia e o comando remoto de equipamentos, como comentamos anteriormente, ressaltando a segurança para o paciente, uma vez que a comunicação direta deste com o operador é constante.

Assim, o grande desafio para um futuro próximo na saúde para resolver o acesso, alta demanda e limitação de recursos é o paradigma “remoto – local”: transição de um exame realizado totalmente no local para um modelo híbrido de operação: local, com maior foco no paciente, e à distância, com comando remoto altamente especializado.

Artigo escrito em parceria com José Leovigildo Coelho, formado em ciências da computação pela UFPE, com especialização em inovação e empreendedorismo na Harvard Business School e MIT Executive Education. É pesquisador da FGV Conhecimento, CEO e fundador da IONIC Health, além de ser Sócio da IARA Health.

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Colunista Gustavo Meirelles

Gustavo Meirelles

É fundador, investidor e conselheiro de startups, principalmente na área da saúde. Médico radiologista, com especialização, doutorado e pós-doutorado no Brasil e no exterior. Tem experiência como executivo de grandes empresas de saúde, com MBA em gestão empresarial. Mais informações em: www.gustavomeirelles.com.

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